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18.8.08

O Conto da Semente

Naquele Reino não existia compaixão, perdão, alegria, gratidão, humildade, simplicidade, carisma ou humanidade, o que havia ali, eram decepções e tragédias, o mau-humor dos comerciantes e a ganância super-desenvolvida.
Não havia sinceridade, pois ninguém se olhava nos olhos. A conquista provinha de poder, fazendo com que os menos afortunados se recolhessem à sua vida, sem motivos ou necessidades.
O homem mais novo, já não tinha mais idade para Sonhar, pois, no Reino as pessoas entendiam os Sonhos como algo surreal e utópico, sendo assim, somente as crianças tinham direito à eles.
As flores e os animais resumiam-se à pasto e rebanho, e, é claro, às moscas que sobrevoavam aos montes nos corpos putrefatos que restavam de bois e vacas.
Existiam poços de água limpa, a única coisa que ligava aquele lugar à vida feliz que existia em algum outro canto do mundo, bem longe dali.
Quando, por momentos lúdicos, alguém assumia estar amando, o apaixonado era dado como louco, pois o Amor era sentimento de destruição e de insanidade.
Todas as pessoas que um dia haviam amado tiveram tristes fins.
Num determinado dia, de uma determinada semana, chegou ao Reino um forasteiro, acompanhado de sua mulher e seus dois filhos, duas crianças.
Prostitutas, ferreiros, padeiros e donas-de-casa, todos os recriminavam. Estavam entrando num lugar onde nada seria oferecido àquelas crianças.
O homem era um pobre carpinteiro, queria apenas um lugar onde os impostos fossem mais baratos e ali, financeiramente falando, seria o lugar ideal.
Depois de instalados, o homem foi á Taberna mais próxima; todos o olharam feio. Ele não deveria estar ali.
-Você viu alguma criança neste lugar Forasteiro? – perguntou um homem ao bar.
-Não, eu deveria ver alguma criança aqui?
-Este lugar não serve para sua família... Faça o que é certo, saia daqui e leve-os consigo.
-Irei educar meus filhos aqui.
O tempo passou.
Fazia cinco anos que a família já estava ali, morando naquele reino.
O filho mais novo do carpinteiro completava seus onze anos, e o mais velho, quatorze. Eram crianças exemplares.
A casa daquela família era a mais viva, mais até que a taberna. Tinha flores no peitoril das janelas, cheiro de carne bem temperada que inundava o lugar todos os dias, no almoço e no jantar.
As crianças ajudavam o pai no que ele precisasse, e, surpreendentemente a carpintaria cada dia mais recebia encomendas importantes.
Quando estava com seus negócios em alta, com mais de dez encomendas diárias, o Carpinteiro decidiu que era hora de partir.
Foi até o Rei da cidade e disse a ele o que achava importante ser dito:
-Majestade, venho aqui hoje, pois desde que cheguei com minha família à esta cidade, estamos tentando entender o que acontece neste lugar. Trouxe aqui esta semente. O fruto desta árvore fará com que todo o seu reino prospere. Como carpinteiro eu tenho o dever de conhecer cada madeira de cada árvore existente, portanto, sei que dará bons resultados.
E o carpinteiro entregou uma semente ao Rei. Amarelada e pequena.
-Se é prosperidade o que quer, porque não me entregou esta semente há mais tempo? Vive aqui há quase dez anos! – falou o Rei.
-Não posso participar do processo de germinação desta semente, porque não seria justo com todos os habitantes de seu Reino. Não sou um de vocês. Nunca fui. Sempre mantive minha família num mundo onde não havia roubos e ganâncias... Protegi meu Reino, Minha Família, mas não posso fazer isso com o seu Reino, iria contra o que acredito. Só agora entendo a necessidade de cada uma das pessoas deste lugar. Tome esta carta, abra-a se sentir que tudo está perdido – o carpinteiro entregou uma carta ao Rei.
O Carpinteiro e sua família partiram.
O rei pediu que um de seus guardas fosse buscar o Floricultor mais famoso das paragens. O homem tentou de tudo, por semanas seguidas, mas nada acontecia. A semente não respondia aos tratamentos mais intensos que poderia ser dado à um vegetal. O floricultor chegou a pensar que era uma brincadeira, que aquela semente deveria ter sido feita artesanalmente, nunca pôs em questão que ele poderia estar errando de alguma forma.
Os guardas, à pedido do Rei, foram buscar a bruxa que morava na Floresta. Assim como o floricultor, não obteve sucesso, mesmo tentando todas as artimanhas que já havia usado.
Então, quase tendo um colapso nervoso, o Rei, enfurecido, mandou que buscassem o Carpinteiro, pois seria preso e sua família escravizada, por terem enganado Sua Majestade, mas os guardas não acharam nem resquício das pessoas que moravam naquele humilde lar.
Pensando friamente, o Rei decidiu convocar todo o Reino, para que, juntos, decidissem o que fazer com tal semente.
Disse ao povo tudo o que o Carpinteiro havia prometido com a semente, enquanto a maioria olhava descrente.
Muitas idéias surgiram... Sugeriram jogar a semente no fogo, engolir a semente, atirá-la no poço mais profundo, cortá-la e joga-la na terra, amassá-la, tritura-la, enfim... Todas as idéias foram descartadas.
O Rei, então, decidiu que era hora de abrir a carta deixada pelo Carpinteiro:
“Majestade, a semente que lhe dei pode representar duas coisas: a primeira é a desunião e o descaso de seu povo, para com algo que irá beneficiá-los; a segunda é o espírito do trabalho em equipe, da busca por melhora e por algo que faça com que cresçam.
Se você está lendo esta carta, é porque as pessoas, as quais governa, estão tão desgarradas e fechadas para mudanças, que uma simples semente tornou-se um problema, não mais uma solução.
A resposta para semear esta semente, é uma pergunta: O que mais ama na vida?
Plantem a semente, este é o segredo. Plantem-na juntos. Plantem também o amor, o carisma, a boa vizinhança, a paz, o espírito de equipe, de união. Plante o respeito, a segurança... Plante com o coração.”
Todos ouviram calados ao que o carpinteiro havia deixado para eles.
Os guardas retornaram da casa do homem, a pedido do Rei, haviam ido revistar a casa, á procura de algo que pudesse levá-los à tal semente. No entanto, regressaram apenas com um vaso, com terra e um bilhete.
“Você é muito previsível, mas não o recrimino, afinal, como humanos somos impacientes e facilitadores... Não estamos preparados para grandes mudanças.
Todos têm defeitos: O padeiro pode deixar cair suor em sua massa e fingir que não viu. O ferreiro pode saber que a espada que fez, não servirá para nada, mas irá vendê-la. O alfaiate irá costurar algo frouxo, para que sua cliente retorne mais rápido... Enfim, devemos buscar, em nosso Íntimo, as nossas qualidades, pois são elas que nos elevam, que nos fazem provar, para nós mesmos, que somos bons em determinadas coisas!
Esta semente é apenas o artefato, o objeto, de meu intento. Tudo o que vive sobre a Terra precisa de sentimentos, se não os têm, precisa recebê-los. E com vocês não é diferente. Esta pode ser a Semente da Prosperidade, da Riqueza, da Sabedoria e do Amor, mas vocês precisam querer que ela seja.”

30 ANOS DEPOIS

Um velho com roupas sujas entrou pelo grande portão prateado da cidade. Muito limpo e aberto, não era o mesmo lugar de trinta anos atrás.
Muitas crianças brincavam pela cidade, corriam e pulavam. Estavam felizes.
O velho caminhou até o centro da cidade, aonde existia uma enorme árvore, de frutos alaranjados, a sombra que produzia era enorme e muito bem-vinda, afinal, o velho havia andado quilômetros sob sol forte... Precisava descansar e comer alguma coisa. O velho também estava feliz.
-O Senhor tem fome? – perguntou um jovem, de aproximadamente quinze anos.
-Sim, meu filho, eu tenho – respondeu.
-Vou pegar alguns frutos para o senhor, eles matam a fome e a sede também! – disse o menino, subindo em um dos galhos e selecionando os melhores frutos para dar ao senhor.
O menino entregou o fruto ao homem e sentou ao seu lado.
-De onde o Senhor vem?
-Venho de um lugar cinzento, fui levar algumas sementes para lá.
-O Senhor é florista?
-Não, não sou um Floricultor.
-Então por que leva sementes para lugares cinza?
-Para que fiquem assim, coloridos como aqui. Você não gosta?
-Gosto! O Senhor também trouxe uma semente para cá?
-Sim, e ela está me alimentando agora – o velho falou, dando uma mordida da fruta suculenta.
-Quantas árvores o senhor já plantou?
-Nenhuma.
-E como o Senhor leva sementes para os outros, se nunca plantou nada?
-Já plantei muitas outras coisas.
-O que se planta, que não é árvore?
-Esperança e a possibilidade de uma vida melhor, que só depende de cada um.
-Mas, o nosso reino sempre foi tão lindo!
-Sim, sempre foi – mentiu o velho, sorrindo.
O velho olhou para a casa onde morou com sua família por quase dez anos. Foi ali que criou seus filhos e tinha sua mulher... Uma lágrima de orgulho escorreu por sua face.
-Por que o Senhor está chorando? Está triste?
-Não, pelo contrário, estou feliz.
-Então não precisa chorar... Quando estamos felizes, nós sorrimos!
-Eu choro porque vejo que plantei a alegria e a paz.
-Plantou?
-Um dia, rapazinho, você saberá da história de um lugarzinho cinza, que desabrochou com uma semente de Laranja, escondido dentro de uma bolinha de barro... E neste dia, você entenderá que nem sempre a dificuldade está no que temos em nossas mãos, mas no bloqueio que criamos em nossa mente. Quando ouvir esta história, terá maior facilidade para entender o que é o Amor, a Humildade e o Espírito de Equipe.